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Coluna: Entre Linhas com Ivana de Negri

Publicada em: 28/08/2025 07:30 -

Cronicando

Ivana Maria França de Negri

 

Sempre admirei quem escreve amiúde para a imprensa, e com qualidade. Escrever, todo mundo escreve, é só ser alfabetizado, mas ter aquele “algo mais” que cativa o leitor é privilégio de poucos. Um mesmo fato narrado por diferentes fontes pode ter inúmeras versões. Umas tão sem graça, que a gente corre os olhos pelas primeiras frases e nem se interessa pelo resto, mas outras, vindas dos verdadeiros guardiões do segredo de prender o leitor do começo ao fim da narrativa, tornam-se sucesso da noite para o dia.

 

Traquejo literário, muita leitura, estudo da língua mãe, uso de ricas figuras de linguagem, tudo isso conta, mas ter o dom é fundamental, e é o que faz a diferença.

           

Alguns escritores conseguem escrever apenas dois ou três textos monumentais durante a vida, produções que caem no agrado popular e fazem o autor conhecer o sabor do sucesso. Com o nome consagrado e inscrito no rol da fama, eles se mantêm o resto do tempo apenas medíocres.

           

Acredito que os escritores usuais, que têm por obrigação escrever textos diários ou semanais, alguns encomendados abordando temas do momento, fatalmente tenham algumas vezes a “síndrome do branco”, quando nada brota, ou se brota, acaba saindo tipo lugar-comum, nada que o diferencie de outros textos. Mas creio também que escrever frequentemente é algo assim como leite de mãe: quanto mais se tira, mais  jorra - foi esta a analogia que me veio à mente. E quanto mais se escreve, mais se quer escrever, vira mania, doença, vício, sei lá, uma espécie de comichão nas mãos que têm urgência em dedilhar o teclado do computador sempre que a inspiração chega. E ela vem nos momentos mais inusitados. Pode ser durante o banho, num passeio, na rua, no cinema, no trabalho, dentro do carro, e nessas horas a pessoa daria tudo por um lápis e papel. E se não anota as palavras ou as frases imediatamente, depois não adianta, a inspiração foge, se apaga e não volta. É como um raio, um lampejo na mente, ou como os sonhos que a gente lembra deles nitidamente ao acordar e os esquecemos segundos depois.

 

Penso que as inspirações são mensagens divinas, vindas de entidades superiores e  iluminadas que “sopram” as palavras e ideias na mente através das coisas mais simples, tal como a visão de uma flor, de um inseto, de um raio de luar, o som de uma música ou o odor de um perfume despertando variadas sensações. Qualquer acontecimento pode desencadear o momento mágico da criação.

 

Para receber com frequência essa verdadeira bênção é preciso ter o coração aberto e a alma limpa e assim poder captar as sutilezas que pululam a todo instante diante de nós, mas só quando devidamente preparados somos capazes de decifrá-las e senti-las. Se estamos muito estressados, cansados, cheios de pensamentos negativos, sob o domínio de bebidas alcoólicas, nicotina ou outros hábitos ruins que nos fazem vibrar grosseiramente, criamos uma aura nociva que automaticamente repele a inspiração, e ela passa despercebida. Mas se cultivamos bons pensamentos e abrimos a alma e o coração, praticando a bondade, essa pureza vai abrir janelas e portais.

 

É quando muitos conseguem atingir o êxtase, estados nirvânicos de arrebatamento, quando o corpo parece flutuar, dissolver-se, e a luz da alma extrapola os limites corpóreos e se revela. Só então nascem as pérolas literárias que encantam e atravessam continentes.

 

                                        Ivana Maria França de Negri é escritora

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