Despedida de Angela Ro Ro: Celebrando sua trajetória e a importância de valorizar e homenagear nossos artistas ainda em Vida

É imperativo repensar profundamente a nossa relação com os artistas, abandonando a postura de mera admiração póstuma e promovendo uma valorização contínua que respeite sua dignidade, sua trajetória e sua humanidade. Chega de perpetuar uma cultura de negligência e invisibilidade, na qual muitos desses profissionais, especialmente aqueles que alcançam idades avançadas ou estão em fases finais de suas carreiras, são sistematicamente esquecidos ou subestimados enquanto ainda vivem.

A cruel realidade do etarismo, uma forma de discriminação que marginaliza e desvaloriza pessoas por sua idade, se manifesta de forma silenciosa, mas devastadora, na vida desses artistas. Eles muitas vezes enfrentam dificuldades financeiras, problemas emocionais e, por vezes, depressão, agravados pelo desprezo social que recebem. São seres humanos que, após anos de dedicação e sacrifício, veem seu esforço ser desconsiderado na hora mais crucial: quando ainda podem receber reconhecimento, carinho e apoio.

A nossa cultura de celebridade costuma privilegiar o espetáculo da homenagem póstuma, que muitas vezes se revela hipócrita e superficial. Redes sociais se enchem de mensagens de luto e admiração apenas após a partida de um artista, como se só então fosse possível reconhecer seu verdadeiro valor. Essa postura revela uma falta de empatia e uma compreensão superficial do que significa valorizar alguém de maneira genuína. É como se só pudesse celebrar uma vida após ela ter se encerrado, deixando para trás um rastro de oportunidades perdidas de reconhecimento e gratidão.

Por que insistimos em esperar a morte para prestar homenagens sinceras? Por que não podemos, enquanto eles ainda respiram, reconhecer suas contribuições, apoiá-los em suas dificuldades e celebrar suas vidas com a dignidade que merecem? É fundamental mudar essa mentalidade e estabelecer uma cultura de valorização contínua, que enalteça o artista em sua plena humanidade, reconhecendo sua trajetória, sua luta e sua dedicação enquanto ainda podem ouvir e sentir esse reconhecimento.

A verdadeira homenagem não está apenas na palavra de despedida, mas no compromisso de apoiá-los ao longo de toda a jornada. Isso implica em políticas públicas que garantam condições dignas de vida para artistas idosos, em uma sociedade que valorize a arte e quem a produz, independentemente do estágio de sua carreira. Significa também um olhar mais atento às necessidades emocionais desses profissionais, promovendo inclusão, respeito e reconhecimento constantes.

Só assim construiremos uma cultura mais justa, humana e sensível, onde a valorização do artista não seja um ato de conveniência ou de convenção social, mas uma expressão genuína de respeito e gratidão por quem dedica sua vida a enriquecer a nossa cultura, nossa história e nossa humanidade. 

O caso da cantora e compositora Angela Ro Ro revela uma triste realidade que muitas artistas enfrentam ao longo de suas vidas. Icone da MPB, com um talento incomparável e uma voz que marcou gerações, ela deixou um legado de obras-primas que enriquecem a música brasileira. No entanto, sua vida pessoal foi marcada por dificuldades que, infelizmente, acabaram ganhando mais atenção na mídia do que sua contribuição artística.

Ao enfrentar problemas de saúde, Angela precisou de apoio financeiro para custear seu tratamento, chegando a pedir ajuda aos fãs, o que evidencia a falta de apoio de colegas de profissão e da estrutura que poderia ampará-la nesses momentos difíceis. Sua partida, sem o respaldo esperado, reforça a importância de refletirmos sobre o valor que damos aos artistas enquanto estão entre nós e sobre a necessidade de criar redes de solidariedade e suporte.

Hoje, após sua morte, diversos colegas, fãs e admiradores se manifestam com mensagens de condolência e homenagem. Que essas manifestações sirvam também para lembrar a todos nós da importância de valorizar e cuidar daqueles que contribuem com a cultura brasileira, garantindo que seu legado seja preservado e que situações como a de Angela Ro Ro não se repitam.

Elson de Belém é Artista e Comunicador Cultural

Fonte CCPZ

Foto reprodução internet